Jornalistas de Pemba capacitados em matérias de Jornalismo de Dados

As sessões de mentoria decorram de 14 a 16 de Novembro de 2018, na Cidade de Pemba, Provincia de Cabo Delgado, e contou com quatro jornalistas de três órgãos de informação impressos nacionais, nomeadamente Jornal Horizonte, Pemba Hoye e O País, onde permitiu que os mesmos pudessem reflectir sobre o contexto cada vez mais exigente das TICs que dá origem ao Jornalismo de Dados, um novo ramo que combina o tradicional e a modernidade para conferir maior dinâmica à profissão
Esta actividade foi marcada por dois momentos, o primeiro tinha a ver a componente teórica da matéria, no qual os jornalistas foram introduzidos os principais conceitos do Jornalismo de Dados e os cuidados a ter ao lidar com uma área tanto quanto complexa, a dos números. Num segundo momento, foram feitas actividades práticas para garantir que os participantes assimilassem os conhecimentos teóricos ministrados. A componente prática incluiu a discussão de temas específicos previamente apresentados pelos participantes para, posteriormente, produzirem artigos concretos usando as técnicas de jornalismo de dados.
Esperara-se que, com esta capacitação, os jornalistas tenham competências básicas que permitam calcular percentagens, médias, proporções ou variações e que também dominem as principais ferramentas de trabalho em jornalismo de Dados, nomeadamente, o Google Spreadsheets (Excel online que serve para fazer diversos cálculos estatísticos e construção de gráficos de vários tipos), Datawrapper (permite criar gráficos e mapas de Moçambique por província), Google MyMaps (permite acrescentar pontos no mapa, trajectos, formatos) e Google Earth (visão de satélite de todo o mundo, tem também a opção de ver como eram os terrenos no passado).

Casamentos prematuros órfãos nos jornais diários em Moçambique

 “Não existe revelação mais nítida da alma de uma sociedade do que a forma como esta trata as suas crianças” Nelson Mandela.

Hoje, 20 de Novembro, celebra-se o Dia Mundial da Criança. O lema escolhido pela Rede Criança e a Visão Mundial para advocacia neste dia é “ Casamento Prematuro deve ser penalizado”. A questão de casamentos prematuros em Moçambique constitui uma séria transgressão dos direitos da criança, atingindo na sua maioria a rapariga. Os casamentos prematuros são definidos como união marital, envolvendo uma pessoa com idade inferior a 18 anos, que é criança, pois não é capaz de dar o seu consentimento válido para se casar[1].

Em Moçambique esta violação dos Direitos Humanos das raparigas põem em causa o seu desenvolvimento físico, intelectual e psicológico, sendo um grave problema socioeconómico que tem sido ainda “um dos assuntos negligenciados”. Esta problemática faz com que Moçambique seja considerado o décimo país do mundo com uma prevalência de casamentos prematuros mais elevada[2]. Entendemos que os media podem desempenhar um papel preponderante na prevenção e no combate à violação dos Direitos Humanos das raparigas, comunicando, formando a opinião pública, educando e influenciando positivamente o comportamento dos principais actores.

Em 2016 entrou em vigor a Estratégia Nacional para a Prevenção e Combate aos Casamentos Prematuros-2016-2019. Para perceber como a media tem contribuído para a acesso à informação sobre os casamentos prematuros, analisamos a cobertura jornalística dos dois maiores jornais diários moçambicanos, “ Notícias” e o “ O País” durante um ano. Pensa-se que os jornalistas, sendo especialistas dos meios de comunicação social, devem usar os seus conhecimentos para auxiliar, monitorar e promover a implementação dos direitos consagrados na Convecção sobre os Direitos da Criança, com o intuito de ajudar as crianças a entender e expressar os seus direitos e, também, para colocar e manter as questões da criança na agenda.

Contudo, a nossa análise mostra que os jornais “Notícias” e “O País” se eximem de fazer análises profundas dos reais contextos, causas e consequências sobre a problemática de casamentos prematuros em Moçambique. Apesar de os dois jornais, “Notícias” e “O País”, divulgarem informações que visem a prevenção e o combate aos casamentos prematuros.

Com efeito, a maior parte dos artigos analisados sobre a questão de casamentos prematuros nos dois jornais, não foi assinada, o que se traduziu em artigos menos trabalhados.

A paternidade dos artigos jornalísticos sobre casamentos prematuros em Moçambique

Gráfico 1:

O gráfico revela que a variável “sem assinatura” (que representa artigos que não são assinados), é mais destacada nos dois diários. No jornal Notícias, 47 artigos analisados, equivalentes a 73.4%, não foram assinados. E 13 artigos jornalísticos publicados não assinados, equivalentes a 43.3%, são do jornal O País. Ou seja, o jornal Notícias, um jornal financiado com fundos públicos destaca-se na publicação de artigos menos trabalhados e mais curtos, isso porque os jornalistas não se dedicam correctamente a cada texto produzido.[3]

 

No que diz respeito às variáveis “sexo feminino e masculino”, o jornal Notícias apresenta um equilíbrio entre os jornalistas do sexo feminino e masculino na cobertura jornalística da problemática de casamentos prematuros no país. Do total de artigos analisados no jornal Notícias, 9 artigos foram assinados por jornalistas do sexo feminino (14.1%)  e, 8 artigos assinados por jornalistas do sexo masculino (12.5%). Contudo, o jornal O País privilegiou os jornalistas do sexo masculino para a cobertura dos casamentos prematuros. Este jornal presenta maior percentagem de artigos assinados pelos homens com 36.7%, equivalente a 11 artigos, em relação à percentagem das mulheres que é de 20%, equivalente a 6 artigos publicados.

Fontes de informação nos artigos jornalísticos sobre casamentos prematuros em Moçambique

Gráfico 2:

Conforme o gráfico acima, é possível constatar que no jornal Notícias, as fontes governamentais são as mais predominantes nos artigos; no universo de 64 peças jornalísticas analisadas do Notícias, 44.5% das fontes que sustentam a informação são governamentais e foram utilizadas em 41 artigos. Houve 37% de artigos elaborados com base em fontes particulares onde se destacam as organizações da sociedade civil, utilizadas em 34 artigos e, em menor medida, são ouvidas as fontes informais com 12%, utilizadas em 11 artigos. O diário O País não foge muito da tendência do Notícias. Dos 30 artigos publicados pelo O País, 61.1% privilegiam as fontes governamentais que foram utilizadas em 22 artigos; e em 19.5% das fontes particulares, utilizadas em 7 artigos. As fontes informais não tiveram muito espaço, tendo 8.3%, utilizadas em 3 peças identificadas.

Total de publicações sobre casamentos prematuros em Moçambique nos dois jornais

O universo de artigos jornalísticos recolhidos ao longo da análise e sua repartição pelos jornais diários (Notícias e O País). Ao todo, foram 94 artigos que abordam a questão de casamentos prematuros nos dois jornais diários, de Janeiro de 2016 a Dezembro do mesmo ano. Em termos de notícias publicadas, o jornal Notícias deu mais destaque ao assunto de casamentos prematuros com 64 artigos publicados, equivalentes a 68,1 por cento. E o jornal O País teve o total de 30 artigos publicados, equivalentes a 31,9 por cento.

Considerações:

Em termos gerais, esta análise de cobertura jornalística revela que têm que ser criadas condições de vária ordem para que o jornalista possa trazer artigos que contribuam mais na educação e mudança de comportamento dos diversos actores envolvidos na questão de casamentos prematuros no país, o que, consequentemente, pode contribuir para a prevenção e o combate desta prática social[4].

 

[1] Open Society Initiative for Southern Africa. Narrative report template. Moçambique, 2016. 2

[2] Rede de Comunicadores Amigos da Criança. A Criança na Imprensa: Análise
da cobertura jornalística. Moçambique, 2013.

[3] CORREIA, Karla Marthinna Viana. Análise de conteúdo do Jornalismo Impresso Natalense. Universidade Federal do Rio Grande do Note: Natal, 2007. 153 p.

[4] Por Jacob Mapossa, analista de dados licenciado em Jornalismo na Universidade Eduardo Mondlane.

Por um parto mais seguro, MISAU Proíbe Parteiras Tradicionais De Assistir Partos Domiciliares

Nesta reportagem, conheça os saberes e o dilema das parteiras tradicionais na Cidade de Maputo.

O saber e o ofício das parteiras tradicionais, apesar de invisíveis nas cidades ainda são vistos hoje como uma alternativa na saúde da mulher e criança nas zonas rurais, cujo acesso à assistência médica é limitado. A maioria delas não sabe ler nem escrever, transmite seus saberes oralmente de mãe para filha, avó para neta, cunhada para concunhada ou simplesmente de geração em geração. São mulheres domésticas, agricultoras porém, detentoras de um conhecimento bem peculiar nos tempos modernos.

De acordo com a Assessora do Departamento de Saúde da Mulher e Criança, Elsa Jacinto em Moçambique existem aproximadamente 6.200 parteiras tradicionais. A maioria delas encontra-se na província da Zambézia (1064), seguido de Nampula (1028), Cabo Delgado (575), Inhambane (523). Na província de Maputo existem 401 parteiras tradicionais, Maputo Cidade 39 das quais 16 encontram-se nos distrito municipal Ka Tembe e 23 no Ka Nyaka. Essas mulheres  possuem um saber empírico e milenar. Assistem domiciliarmente a outras mulheres  durante a gestação, parto, prestando também os primeiros cuidados aos recém-nascidos. Por actuarem em zonas rurais, onde a população é carenciada e por acreditar que o seu ofício seja um dom Divino, não cobram pela assistência, bastando apenas reconhecimento e agradecimento.

Grupo de parteiras tradicionais do distrito municipal Katembe (Cidade de Maputo) em reunião mensal

Saberes das parteiras tradicionais e os impactos para a saúde materno-infantil

Ana Macuani de 57 anos, doméstica, residente no bairro de Cumbeza no distrito de Marracuene é uma delas. A sua trajectória como parteira tradicional começa depois de ter tido  seus dois filhos pelas mãos da mãe, e sempre que esta fosse assistir a um parto Macuani ia junto. Macuani conta que já realizou seis partos, dos quais quatro foram com a sua vizinha Salmina Xiwindze. Embora tenham vindo ao mundo pelas mãos de uma parteira tradicional, todos nasceram e continuam saudáveis.

Salmina Xiwindze, doméstica de 34 anos justifica que as dificuldades económicas e a ausência de maternidades em Cumbeza foram os motivos que a levaram a dar a luz em casa, porém, mostra-se satisfeita por ver os filhos (um de 15 e outro de 3anos) crescerem com saúde e, como forma de agradecimento, atribuiu a um dos filhos o nome da parteira Macuane. Um dos filhos é chara da parteira.

Procedimentos para evitar infecções durante o parto

Expectativas, ansiedade, medo, preocupação,  planeamento, são alguns  aspectos que surgem quando se gera uma vida. Toda mulher grávida vive variedades de sentimentos na esperança de que seu bebé venha ao mundo tranquilo e sem sofrimento. Em fim, que o mesmo esteja e seja saudável.

Aliás, esta tem sido uma das razões que leva a que muitas mulheres optem por acompanhamento pré e pós-natal nas unidades sanitárias ou clinicas privadas, ainda que tenha implicações financeiras.

Uma das formas de prevenir infecções tanto na mãe como no bebé, é “ medir três dedos acima da barriga e cortar o cordão umbilical com uma lâmina nova fervida em água limpa, depois dobrar uma linha de coser quatro vezes até ficar grossa, em seguida fervê-la para amarrar o cordão umbilical”, revelou Macuani

Parteiras no acompanhamento pós-parto

O trabalho das parteiras tradicionais não termina no parto. O fornecimento de medicamentos, constituídos maioritariamente por ervas, raízes e folhas para cuidados pós-parto também faz parte das responsabilidades da parteira. Para receitar é preciso conhecer tais medicamentos. Adélia Fabião, residente do bairro Incassane, distrito municipal Ka Tembe, que se tornou parteira por curiosidade, os conhece.

A fonte revela que obteve os conhecimentos à partir do convívio com uma cunhada curandeira. Embora saiba mencionar os nomes dos remédios em changana, Adélia Fabião destacou o “Muzo ya wethy e Txenlelo”, o primeiro que na língua portuguesa significa remédio da lua e, é feito á base de raízes.

 Aos  55 anos, Adélia Fabião é agricultora e mãe de seis filhos. O parto dos primeiros três foi feito no hospital, e porque Adélia pôde acompanhar os próprios partos, os partos dos três outros filhos foram feitos em casa, pela própria gestante. Além dos próprios partos, Adélia já assistiu a outros cinco, tendo registado algum problema apenas com a última parturiente, que não libertou o habitual corrimento sanguinolento.

A parteira conta que após o bebé ter nascido, o enrolou com uma capulana e o colocou de lado para atender a mãe que não libertava o corrimento. De imediato, a parteira massageou a região do útero, posteriormente foi ao mato buscar algumas ervas. “Pilei as ervas e coloquei uma parte no copo com água e outra na peneira. A mulher deve beber  o remédio de joelho enquanto a parteira efectua os movimentos com a peneira,  de seguida a sujidade sairá sem precisar forçar”,  revelou.

As parteiras acima referenciadas, dizem que na actualidade dificilmente aceitam assistir um parto, pois segundo elas o MISAU proíbe.

Adélia Fabião à direita demostrando como peneirou o remédio para salvar sua parturiente

Posicionamento do MISAU em relação ás parteiras tradicionais

O parto realizado por parteiras tradicionais foi considerado normal por muito tempo, no entanto depois da independência de Moçambique, por motivos de segurança e salvaguarda da vida mãe e do recém-nascido, estas passaram a desempenhar um outro papel, tal como afirma Elsa Jacinto, assessora do departamento de Saúde da Mulher e Criança. “Hoje, as parteiras tradicionais são tidas como parceiras do MISAU e funcionam como activistas.

Estão proibidas de fazer  partos domiciliares senão em situações de emergência, ou seja, caso não haja mais tempo ou transporte para chegar a maternidade mais próxima. E o dever delas é encaminhar as mulheres grávidas para as maternidades de modo a terem um parto institucional”, disse. Segundo Elsa Jacinto, as parteiras tradicionais são capacitadas e treinadas anualmente para evitarem casos de hemorragia pós-parto nas poucas situações ocasionais que forem a actuar.

Facto é que, com a proibição, as parteiras não recebem o material necessário para a realização do parto, mas oferecemos misoprostol, comprimidos para elas darem as parturientes sempre que realizarem um parto ocasional, antes que ocorra uma hemorragia”, acrescentou.

E ainda, segundo Elsa Jacinto, as parteiras tradicionais reuninem˗se nas unidades sanitárias, todos os meses para fazer a avaliação mensal, onde cada uma faz o relatório do trabalho desenvolvido. Por sua vez, as unidades sanitárias encaminham para o MISAU.

No entanto entrevistadas pelo Media Femme, as parteiras tradicionais desmentem a disponibilização do comprimido referenciado pela assessora. Ilda Titos de 63 anos e Alice Tembe de 60 anos residentes na Ka Tembe, nos bairros de Incassane e Inguide respectivamente, são exemplos de mulheres que se beneficiaram da capacitação. A primeira é agricultora e a segunda é vendedora de peixe. Elas contam que funcionam como agentes de saúde comunitária e, que por vezes tem de abandonar as suas actividades produtivas para auxiliarem as unidades sanitárias.

Dentre várias missões, tem de conhecer todas as mulheres grávidas das suas comunidades, encaminhá-las ao hospital para as consultas pré-natais, acompanhá-las a maternidade no dia do parto e visitar os doentes.

Ilda Titos aprendeu o oficio com a mãe, no entanto não lembra mais o número de partos que realizou, sabe apenas que passou de 30. A fonte conta que no início das capacitações o MISAU disponibilizou para todas as parteiras um kit para o parto, porém “em 2016 iniciaram com as proibições e mandaram-nos que devolver”, acrescentou.

Como consequência disso, Alice Tembe diz que quando surgem mulheres que entram em trabalho de parto de noite ou mesmo a caminho da maternidade são obrigadas  fazer o parto sem o devido material.  Por via disso, há parteiras que aconselham as parturientes a comprarem pelo menos, lâmina e linha e deixarem em casa, para caso de eventualidades.

Ambas revelaram, por unanimidade, que fazem o trabalho por gosto, no entanto, para cobrir as suas dificuldades financeiras gostariam de ganhar algum subsídio por parte do MISAU, com quem fazem este trabalho de forma oficial. Trata-se de uma possibilidade que pode se considerar descartada, a olhar pelas declarações da assessora do departamento de Saúde da Mulher e Criança que ressalvou que o MISAU não tem nenhuma intenção de remunerar as parteiras, senão oferecer capulanas, lenços, bonés, capa de chuva e num futuro disponibilizar-lhes botas e crachás”.

Para além de falta de salário Alice Tembe ( à esquerda) clama por melhores condições de trabalho

Embora não sejam prestigiadas como desejam, as parteiras tradicionais continuam a desenvolver várias actividades em prol da saúde materno-infantil, considerando que segundo o jornal O País, a capacidade de partos institucionais em Moçambique que é de apenas cerca de 70%, sendo que os restantes cerca de 30% acontecem fora das maternidades. E dados estatísticos do Departamento de Saúde da Mulher e Criança, só no primeiro semestre de 2018 por exemplo, a província de Maputo registou 791 partos tradicionais, tendo sido 362 em Maputo cidade e 429 em Maputo província.

 

 

Por Imelda Trinta

“Sempre mandam-nos aguardarˮ Mães de filhos com necessidades especiais enfrentam dificuldades no acesso à educação

Um dos maiores desafios que Moçambique enfrenta é o acesso à educação, tendo em conta que mais de 40% da população é analfabeta, este desafio agrava-se quando se trata de pessoas com Necessidades Educativas Especiais, uma condição que não só afecta as a elas, mas também as suas famílias que se vêm obrigadas a travar uma luta diária para conseguir autonomia dos filhos e garantir melhor qualidade de vida.

De acordo com dados fornecidos pelo Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano (MINEDH), existem em Moçambique 164.876 crianças e jovens com algum tipo de deficiência, dos quais 103.276 são menores de 14 anos e apenas 47,6% dessas crianças estão no ensino primário e secundário. Apesar de o Ministério ter estratégias com vista a criar condições necessárias para a educação inclusiva e desenvolvimento das crianças com deficiência, ainda existem muitas famílias que têm filhos com alguma necessidade educativa especial, que nunca frequentaram a escola. Este é o caso de Joaninha (17), a quarta de um total de sete filhos da dona  Rosa Salama (47).

Rosa Salama conta que aos dois anos, a filha começou a adoecer com muita frequência, tendo até sido internada cinco vezes, mas dona Rosa nunca era informada sobre a real doença da filha. “Quando ela adoencia, eu a levava sempre ao Hospital Central [ de Maputo] e na época os médicos diziam tratar-se de anemia. Passado algum tempo começou a ter dificuldades na fala e o seu crescimento era fora do padrão. Hoje, com 17 anos aparenta uma criança de 10”, lembra a mãe da adolescente, que conta ainda que a menina nunca teve contacto com a escola apesar de certa vez ter tentado inscrevê-la numa escola próxima. “Pediram que aguardasse, e nunca fui chamada. Acabei optando por deixá-la em casa, mas ainda sonho vê-la a estudar.”

Aos 17 anos, Joaninha passa o dia inteiro em casa a fazer algumas tarefas domésticas e a brincar com os amigos que a ensinam a contar. A mãe fala orgulhosa que a menina sabe contar até dez.

Maria José (14) tem uma história oposta à da Joaninha, pois, graças a persistência do pais ela frequenta a escola. Maria foi diagnosticada cegueira aos 3 anos. Depois de várias tentativas em inserí-la numa escola, apenas aos 10 anos foi aceite numa que a mãe, Ester Sithole – que nunca pensou em inscrevê-la numa escola especial – considera reunir condições para que a filha possa estudar em pé de igualdade com as outras crianças aparentemente sem nenhuma deficiência. “Acredito que o facto dela estar numa escola regular constitui vantagem porque não é diferente de outras crianças, só precisa de mais atenção e ela nunca reclamou de exclusão, muito pelo contrário, os colegas a apoiam sempre, também acredito que numa escola especial a evolução dela seria mais lenta”. Hoje, com 14 anos e a frequentar a quarta classe, Maria é uma das  melhores alunas da turma e motivo de orgulho para os pais que garantem que apesar das dificuldades, continuarão a empreender o máximo de esforço para que a filha frequente a escola.

Confrontada sobre o caso das duas mães, a Chefe do Departamento de Educação Especial do MINEDH , Maria Luisa Manguana assegurou que todas as escolas são instruidas a receber os alunos com qualquer tipo de necessidade e orientadas a reportar aos Serviços Distritais da Educação, Juventude e Tecnologia e estes, por sua vez, à Direcção Provincial da Educação e Desenvolvimento Humano para capacitar os professores a atender esses alunos.

Ao nível das comunidades rurais, vários factores contribuem para que as pessoas com necessidades educativas não frequentem a escola, entre elas superstição tal como afirma Nacima Figia, Especialista em Educação, na Save the Children International em Moçambique (SCiMoz) . “Geralmente, as famílias que têm uma pessoa com necessidades especiais alegam que a deficiência é decorrente de espiritos dos antepassados que não queriam o nascimento da criança ou a mãe não foi abençoada, e recomendam que a criança não seja aceite. Já nos deparamos com casos de pessoas presas em árvores ou dentro de casa, que recebem comida pela janela. Isso causa um indescritível sofrimento a essas pessoas”. Para reverter este cenário a SCiMoz levou a cabo um trabalho de sensibilização ao nível das comunidades sobre a existência de diversas doenças, no sentido de fazer perceber  que não se trata de nenhum castigo ter uma criança especial, e que não razão de isolar essas pessoas.

O processo de ensino à criancas com NEE’s

Segundo o MINEDH, todas as escolas estão preparadas para atender alunos com NEEs, visto que no curso de formação inicial de professores existe a disciplina de psicopedagogia, na qual são abordados aspectos inerentes ao atendimento às NEEs, porém não na sua plenitute.

Alberto (nome fictício), professor da Escola Secundária Josina Machel, em Maputo, que tem algumas turmas especiais falou ao MediaFemme das dificuldades em dar aulas à alunos com NEEs, pois, ao que conta, os professores não recebem nenhuma formação específica para lidar com estes alunos.

Aqui a maioria dos alunos com NEEs é surda e muda, e temos alguns com as duas deficiências. Mas temos também alunos com distúrbios mentais. Na primeira vez que tive contacto com eles não sabia nada da língua de sinais. Desta forma torna-se difícil o processo de ensino e aprendizagem”.

No entando, de acordo com Maria Luisa Manguane, desde 1998, alunos com NEEs são atendidas em escolas de referência como a Secundaria Josina Machel  e os professores eram capacitados a atender à diversidade educacional na turma inclusiva, porém, por conveniência de serviço (transferência,  para ocupação de posto de trabalho na mesma categoria por razões imperiosas e interess e público) ou reforma dos professores capacitados, estes quadros foram transferidos para outras escolas ou passaram a desempenhar outras funções. Entretanto, para inverter o cenário actual das escolas de referência, tendo como base a Escola Secundária Josina Machel, o Departamento de Educação Especial disponibilizou um técnico e um professor de Educação Especial que estão a trabalhar com alunos surdos e mudos da 8ª, 9ª e 10ª classe, 90 minutos por semana em cada classe, com vista à promoção do desenvolvimento do vocabulário da Língua de Sinais naquele nível de ensino.           

A concordar com o professor Alberto, Eriqueta Tamela, professora da Escola Especial  Cerci Maputo, que trabalha apenas com crianças com NEEs, com particularidade para doenças mentais considera haver necessidade de uma formação específica para lidar com essas crianças. “Infelizmente, as formações não abrangem muito a questão diferentes tipos de necessidades, só se fala que é deficiente.            Os professores não estão habilitados a saber, por exemplo, o que é um autista, quais são as dificuldades, os sintomas que vão permitir saber se esta pessoa tem determinada necessidade, qual é a sua área de inclinação, tendo em conta a suas dificuldades” lamentou.

Nacima Figia, da SCiMoz, por sua vez, considera haver um esforço no que diz respeito à inclusão em Moçambique, pois sempre houve uma preocupação na integração na escolas a crianças com NEEs, no entanto, concorda que haja necessidade de mais atenção relativamente à preparação dos próprios professores,  “Hoje em dia, nos currículos e também na formação há a observância da questão de NEEs, porém, em termos práticos existem  limitações tais como não saber lidar com as crianças, pois isso requer, primeiramente, saber distiguir o tipo de necessidade que essa criança tem, bem como o facto dos professores não terem estratégias para gerir turmas numerosas e a falta de material didácticoˮ.

Turmas volumosas como um dos factores que dificultam a inclusão

O rácio aluno/professor em Moçambique (57 alunos por professor) continua acima da média do que é recomendado pela UNESCO que é de 40 alunos por professor, facto que os professores consideram um obstáculo à inclusão, pois,  na sua opinião, pode trazer implicações como a fraca interação, bem como a insatisfação das necessidades académicas dos alunos, o que vem a contribuir para a fraca inclusão tal como afirma Eriqueta Tamele. “Por vezes não é a falta de preparo do professor, vejamos o caso de um professor para  50 alunos dos quais dois têm NEEs, a dado momento o professor fica frustrado porque está a passar uma informação que só um grupo está perceber e ele acaba se aliando ao maior grupo. Os outros ficam à deriva porque no final do ano têm que apresentar resultadosˮ, referiu Eriqueta, que considera que a pessoa com NEE’s tem que estar próximo ao professor para melhor controle, pois, nem sempre tem capacidade de aprender a ler e escrever, e nesse caso o professor deve  procurar descobrir a inclinação do aluno e trabalhar neste ponto.

Estratégias com vista  melhorar a inclusão no país

Para melhorar a qualidade do processo de inclusão em Moçambique, o MINEDH aprovou a estratégia de Educação Inclusiva e desenvolvimento das crianças  com dificiência, (2012-16 que foi estendido para 2019), que contém cinco áreas de intervenção  com vista promover um sistema educativo inclusivo, eficaz e eficiente que garanta que as pessoas  adquiram competências requeridas a nível de conhecimentos, habilidades, gestão e atitudes que respondam às necessidades de desenvolvimento humano.  Segundo a Chefe do Departamento de Educação Especial do MINEDH, Maria Luisa Manguane,  para concretizar essa estratégia criou-se um grupo de implementação “este grupo visa harmonizar as respostas multissectoriais que irão envolver alguns ministérios como, Saúde, Acção Social, Trabalho, Emprego e Segurança Social, de modo que as crianças possam ir a escola e depois da sétima classe aprendam algo para se tornarem independentes”.

Para a articulação dessas iniciativas, conta-se com  serviços promovidos e dinamizados por associações de/e para pessoas com deficiência e ONGs para uma completa inserção comunitária das práticas inclusivas. É o caso da Save The Children que trabalhou com o sector da saúde como forma de identificar crianças com NEE’s e ver que necessidade abrangia maior número de crianças, neste caso, a audição  e visão. Foram capacitados professores e oferececidos materiais como máquinas braille em algumas escolas de Manica e Gaza.

Além do Ministério da Saúde, o projecto envolve o Ministério  da Educação e o da Acção Social, no apoio e atendimento às crianças com vista a facilitação em termos de inserção e sensibilização dos professores  no contexto escolar. O projecto surtiu efeitos positivos pois as famílias sensibilizadas levaram os filhos à escola. De referir que segundo o MINEDH existem no país 8 escolas especiais e 177 escolas primárias e secundárias inclusivas.

No entanto, além do preparo dos professores para lidarem com diferentes tipos de NEE’s, há uma necessidade de criação de um centro de avaliação das aptidões dessas crianças como forma de perceber se a criança tem condições de aprender numa escola regular ou deve estar numa escola especial.

Call for Paper for the Conference “Human Rights and the Media in Mozambique Today”.

International conference of the CEC

At a time when various political and social conflicts are taking place in Mozambique, analysis of respect for human rights is becoming ever more central for ensuring implementation of the rule of law, which is guaranteed by the principles of the Constitution. Within this framework, the press plays a crucial role: to publish information about violations of the most elementary human rights, to diversify sources of information, to contribute towards reaching a commitment involving all social and political actors so that human rights finally takes on a public dimension.

However, with rare exceptions, the coverage of respect for human rights by the Mozambican mass media is still feeble, particularly in cases of violations committed by the state apparatus. There is direct political interference in the editorial choices of the media, particularly the public media, or the media where the State has majority control, ensuring that these omit information or approach it in a one-sided way, using only official sources, without any kind of comparison with other sources. Such a stance is damaging to the right to information enjoyed by citizens. It makes the work of journalists sterile and repetitive, as well as biased, emptying it of public interest content.

CEC has always been committed to respect for human rights, prioritising their analysis in the media and its coverage. Faced with the current increase and diversification of the violations of human rights in Mozambique – with, for example, forced resettlements and land conflicts – CEC is holding its annual conference this year on the theme “Human Rights and the Media in Mozambique Today”.

The main objectives of the conference are the following:

  1. To examine critically the coverage of human rights by the mass media in Mozambique;
  2. To bring to the fore significant examples of the editorial lines of the various mass media, corroborated by empirical research;
  3. To present the results of this research and to debate with media professionals, academics, high level cadres, policy makers, representatives of civil society and citizens in general the perspectives of the Mozambican media towards the treatment of violations and the promotion of human rights.

The conference shall take place in Maputo on 10 December, International Human Rights Day. In line with the themes listed above, those interested should submit a summary of the proposed paper of about 400 words to the e-mail address info@cec.org.mz. The summaries will be assessed by the CEC Scientific Council.

Deadline for presenting the summaries: 10 November 2018

Communication of the summaries accepted: 16 November 2018.

The communications approved, depending on the interest of the authors, may be submitted, 45 days after the Conference for evaluation and later publication in the magazine Comunicacao e Sociedade.

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