Covid-19 agrava desigualdades de género entre raparigas e rapazes

Comemorou-se , a 16 de Junho, o dia da Criança Africana.  A efeméride foi celebrada numa altura em que o país e o mundo enfrenta uma crise humanitária, a pandemia da Covid-19. Para este ano, o Dia da Criança Africana foi celebrado sob o lema “Proteger a Criança é Garantir o Futuro de Moçambique, olhando a necessidade de consciencialização do trabalho infantil, albinismo, uniões prematuras, bem como a protecção da criança contra a Pandemia da Covid-19 e também a preocupação em relação às crianças que vivem em zonas de conflitos armados.

Devido ao fecho das escolas e outras infra-estruturas de apoio, aumenta a sobrecarga de trabalho não pago no contexto da família e da comunidade. Este tipo de ocupação recai sobre as raparigas e os rapazes de formas diferentes. Devido a questões culturais, rapazes e raparigas são ensinados desde cedo que as tarefas domésticas (cozinhar, lavar, cuidar as crianças), são exclusivamente para raparigas e mulheres.

Para Dalila Macuácua, coordenadora geral da Associação Sócio Cultural Horizonte Azul,organização não-governamental que milita em prol dos direitos humanos das crianças, raparigas e mulheres, “a suspensão das aulas aumenta as desigualdades de género, com as meninas a verem reforçada a carga horária nas tarefas domésticas e a verem eliminado o tempo para estudarem”.

Por outro lado, a pandemia de Covid-19 apenas veio reforçar uma realidade que já existia em Moçambique, o trabalho infantil. “O trabalho infantil não é de hoje, apenas a Covid-19 a veio reforçar. Em Moçambique, a maior parte das comunidades que vivem nas áreas periurbanas e nas áreas rurais dependem de uma economia informal diária. As crianças, se já se faziam à rua para vender pequenos produtos para reforçar a renda em casa”, refere Dalila.

Em tempos de crise, milhões de crianças em todo o mundo são empurradas para o trabalho infantil. Um relatório publicado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT), intitulado A Covid-19 e trabalho infantil: num tempo de crise, é tempo de agir, indica que a crise provocada pela pandemia pode conduzir a um aumento da pobreza e a um aumento do trabalho infantil porque as famílias usam todos os meios para sobreviver. O documento explica que as crianças que já eram obrigadas a trabalhar correm o risco de trabalhar ainda mais horas ou em piores condições e que muitas delas podem ser forçadas às piores formas de trabalho infantil.

De acordo com os dois organismos, a pandemia de Covid-19 e o encerramento temporário de escolas veio piorar a situação, afectando mais de mil milhões de alunas e alunos em mais de 130 países.

Em Moçambique, mais de um milhão de crianças com idades compreendidas emtre 7 e 17 anos estão envolvidas no trabalho informal e so na cidade de Maputo contabilizam-se mais de 300 mil crianças, de acordo com os dados apresentados no Portal do Governo de Moçambique. O sector informal é o mais crítico, com 74%.

É recorrente ver crianças e adolescentes nas ruas e mercados da cidade de Maputo a venderem diversos produtos, apesar de o país estar a observar o estado de emergência e as autoridades recomendarem que fiquem em casa.  Alguns menores deambulam à procura de clientes estando expostos a vários riscos. Outros encontram-se nos mercados e pequenas bancas improvisadas nos passeios.

É o caso da Jéssica Alfredo (nome fictício), ela tem 12 anos de idade e vive com os pais e dois irmãos mais novos, no bairro 25 de Junho, na cidade de Maputo. Com a paralisação temporária das aulas, Jessica alterna os trabalhos domesticos e a venda de produtos alimentares no mercado. A menina ajuda a mãe a vender numa banca do mercado próximo. “Quando minha mãe precisa fazer alguma coisa em casa, eu fico aqui no mercado a vender e quando ela volta eu regresso a casa para cuidar dos meus irmaos”, conta a menina, entre algumas pausas para atender os clientes.

Antes do fecho da escola, a menina dividia o tempo entre o estudo e o trabalho e hoje o tempo é dividido entre as tarefas domesticas e o sustento da família.

Por Lédeny Gove

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